Kintsugi


Amor é um lugar de descanso, de sonho 
Em um sono que eu não tenho 

Deixo meu quarto de hotel na escuridão total 
Vejo a janela entreaberta nas pálpebras 
Não há luzes nem bom dia, princesa 
Nesse pesado pesadelo acordado
Não sei mais em que esquina virei 

Estar perdido é não saber onde estamos
Ou pra onde vamos a partir daqui?
Para onde vou, não há plural
Apenas o rugido da diversão de uma sexta
Que se diverte barulhenta janela afora    

Na penumbra, me escrevo em cartas sem remetente
Para um leitor fiel não identificado 
Que já nem sei se sei quem é 
Ou e se é quem sei que acho que é 
Ou se pelo menos foi quem eu queria que fosse 

Textos desconexos escritos a dedo
Temas despedaçados, tépidos, sem resposta
Páginas de lágrimas secas soltas pela sala
Morrendo no vento das janelas abertas 

Os adeus nunca foram ditos, portas abertas
Janelas escancaradas para olhar
O passado passarinho passar 
Deixaram entrar uma corrente de vento tão forte

Que levou meus desejos e bilhetes
Pelos e fios de cabelo 
Tirou meu cheiro da cama velha 
Nada mais meu ficou 

Esses meus pedaços
Varridos da sua pele
Levados pelo vento morno
Flutuam sem destino, despedaçados

Junto meus bilhetinhos e molho
Nas lágrimas salgadas e doces que já chorei
Nas chuvas que namoramos de manhã 
Viro uma boneca de papel machê

Um belo vaso quebrado 
Um livro proibido lido na sombra 
Decidindo se me jogo toda fora 
Ou se colo meus pedacinhos 

Como um kintsugi
Com uma amálgama de laca, ouro
Conversas de terapia, livros de filosofia 
E desejo de ser inteira, valiosa e amada outra vez



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