Estrada sinuosa

 

Uma estrada de curvas sinuosas 
Carrega a carruagem heróica
Daquele que um dia me amou tanto
Que fez a volta e outra vez a ida
Uma Ilíada exaustiva, em um só dia
Para ter comigo no alto 

Eu lembro do cheiro do vento
Mudando de mar para verde para fresco
As bochechas corando, a umidade
O seu beijo tão doce, a mão nos joelhos 
As conversas de estrada
Sua saudade abraçando a minha 

Disse que um dia me levaria 
Em um mítico chalé nas nuvens 
Banqueteamos no meio das flores
Num suave entardecer 
Seu abraço acalmando a brisa fria 
Os dedos girando uma flor pra sempre

A noite, nos amamos
Dormimos de nossas viagens
Agarrados de frio e de fogo
Saímos a andar famintos 
De mãos dadas pelas ruas abarrotadas 
Dois jovens amantes bebendo vinho da garrafa

Devaneamos futuros 
Possíveis e impossíveis 
Você pensando na segurança da Polis
Eu nas fundações de um lar para nós dois
Ou três, ou quatro 
Veja, essa casa é boa
E essa, quanto será? 

Lembramos também do caminho, do passado
De quando você fugiu de casa
Da igreja onde seu irmão pediu ajuda a Deus
Enquanto você, criança, lutava o luto dos homens
Falamos de como o nosso lar seria diferente
Prometemos amor sem abandono e dor 

Mas os deuses pregam peças 
Nas peças, tropeçamos
E caímos na lama das mágoas não resolvidas
Veja, esquecemos que, apesar de tudo
Fomos formados por abandono e dor
E não vimos quando seus tentáculos 
Amarraram nossas mãos 

Duas mãos deslizando no volante, livres
As curvas sinuosas da estrada, da subida
Uma imagem repetida na tela
Sua nuca macia, o cabelo por cortar 
Eu posso até sentir o cheiro da sua pele
Quente acalento como café recém passado 

Desliza, eu te peço
Só mais uma vez as mãos, os dedos
Pelas curvas, pelas dobras do meu mapa 
Sobe uma vez mais nossa montanha 
A viagem é mais curta agora
Já sabemos para onde devemos ir 

Me encontra no chalé das nuvens 
Que eu te prometo paz e paraíso 


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